Crítica – A Garota e a Aranha

Das situações que esperava encontrar ao assistir A Garota e a Aranha, lembrar da sensação que tive quando vi mãe!, de Darren Aronofsky, não era uma delas. Mas, guardada as devidas proporções temáticas, o cenário inicial do filme sueco dirigido pelos irmãos Zürcher lembra bastante o suspense americano estrelado por Jennifer Lawrence, com seu ambiente doméstico um pouco movimentado demais, com situações que não cabem muito bem ali.

Mas A Garota e a Aranha traz um nervosismo mais sutil do que as bizarrices do longa americano. Aqui, acompanhamos um processo de mudança de uma companheira de quarto de Mara (Henriette Confurius), Lisa (Liliane Amuat). A relação entre as duas é indefinida, não é absurdo presumir que algo romântico aconteceu ali, e que Mara não parece estar muito satisfeita com essa mudança. Seu comportamento é errático, para dizer o mínimo, sem atrapalhar o ir e vir do processo, mas suas ações claramente apontam um desejo de interferir na situação, como estressar um cachorro, arranhar um móvel, e afins, além de não ajudar de modo prático em momento algum.

Mas logo fica claro que não é somente Mara que tem um comportamento estranho, embora o dela seja mais evidente, mas a narrativa criada pelos irmãos Zürcher é marcada pela estranheza, por meio de olhares que se demoram um pouco demais sobre alguém, silêncios que se penduram indefinidamente, e até mesmo a atuação dos personagens são fora do usual. É tudo muito marcado, ritmado, como uma estranha dança sem música. Há certa combinação entre imobilidade, visto que os planos são sempre estáticos, com a movimentação nervosa dentro do quadro, com o vai e vem dos personagens, que adiciona mais uma camada de nervosismo, como se uma energia ali contida fosse explodir a qualquer momento, somado ainda aos sons do ambiente, sempre há uma chaleira apitando, uma britadeira na rua.

A estranheza fica por conta também da fluidez das relações do filme, em constante movimento. Uma personagem fala com pessoa B, que logo fala com outra, forma laços com mais uma que até então nem fazia parte da trama e assim vai. Essas relações nunca são muito claras, mas certas tensões sexuais ficam evidentes ali transmitidas em especial por meio do olhar.

Com o tempo, no entanto, essa energia nervosa de A Garota e a Aranha acaba se dissipando, e o ponto alto do filme acaba sendo nesses primeiros momentos, combinando o caos da mudança com a excentricidade dos comportamentos. As relações, tão variadas e complexas, acabam se tornando cansativas por ser tudo na base da inferência, mais ou menos como observar um grupo de pessoas com uma série de piadas internas que nunca permitem que você possa ficar inteirado naquele contexto. É interessante no começo, mas com o passar do tempo, você querendo saber um pouco mais do que está acontecendo de fato. 

Esse texto faz parte da nossa cobertura da Mostra de São Paulo 2021

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *